25 de... A manipulação e a omissão de informação também são violência

Depois de ler as notícias que apareceram ontem e anteontem nos jornais e telejornais da mulherassassinada na sua Clínica Dentária em plena Rua Augusta pelo marido e da notícia das violações reiteradas à uma menina de 14 anos, lembrei-me dos vários comentários de apoio ao vídeo violence is violence” que encontrei um pouco por todo lado. 

Quando o vi achei-o logo tendencioso mas fiquei surpreendida com muitos comentários, de apoio, por isso comecei a escrever este post.

O vídeo mostra a forma como a violência doméstica é entendida pela sociedade dependendo do sexo da vítima. A priori pode parecer um vídeo com o qual as mulheres (principalmente as feministas) deveríamos concordar, porque precisamente nós lutamos pela igualdade e a erradicação da violência mas mesmo assim nos provoca (a uma grande maioria) uma profunda rejeição e eu gostava de explicar o porquê.

Informação falsa e manipulação de dados
Para começar, a estática de que 40% da violência doméstica é investida por mulheres contra os homens é falso. Mas há quem a defenda dizendo: “Mas cuidado, o maltrato psicológico também conta”. Verdade, mas e os homens não maltratam psicologicamente as suas companheiras?! Este é o tipo de violência mais comum e menos visível porque muitas das vítimas nem sequer são conscientes da violência. Por isso falar destes 40% parece-me absurdo e falso. Contudo mesmo parecendo que me estou a contradizer digo-vos que estes 40% são reais, passo a explicar: é verdade que 40% da violência doméstica é contra homens, eles também podem e são vítimas, o que o vídeo não especifica é que a maioria desta violência é cometida por OUTROS HOMENS (pais, avôs, irmão, companheiros e outras figuras de autoridade) e não por parte das mulheres e mais concretamente por parte das suas companheiras, como o vídeo nos faz acreditar. Acho que manipular a informação não ajuda em nada as vitimas quer sejam homens quer sejam mulheres o que me leva a pensar que este vídeo é muito mais do que uma bem-intencionada campanha de sensibilização da violência doméstica sofrida por homens. 

Misoginia oculta
Como muitos outros movimentos pelos “direitos dos homens” esta campanha oculta a verdadeira ideia de fundo do que num princípio nos parecia justo e razoável. É verdade que as mulheres também maltratam os seus companheiros, é uma realidade que não se pode negar, mas esta violência é mínima se a comparamos com as mais de 33 mulheres que morrem oficialmente por ano em Portugal (à data de hoje temos oficialmente um total de 33 femicídios e 32 tentativas de femicídio no ano de 2013 em Portugal. Extra-oficialmente são mais, pois as estatísticas não contam as meninas, nem as familiares, nem as novas companheiras assassinadas, nem as prostitutas nem os crimes misóginos em geral). Quando vejo a reacção das pessoas em proteger a mulher e não ao homem é porque sabem, por muito que doa aceita-lo, que aquela mulher pode acabar morta nessa mesma noite e que ao homem dificilmente lhe pode acontecer o mesmo. A violência de género MATA MULHERES e é esta a realidade e é por esta realidade que as mulheres são as primeiras em reagir perante esta violência como vemos no vídeo. Porque nós sabemos o quanto perigoso pode chegar a ser, somos muito conscientes, vivemos com este terror TODOS OS DIAS durante toda a nossa vida.

É óbvio que violência é violência, e eu também defenderia (e defendo) os homens assim como qualquer ser humano mas este vídeo provoca uma série de reacções, principalmente em homens que se afasta muito da “igualdade”.

A maior parte dos comentários que li apoiando este vídeo são pura demagogia porque se esquecem de mencionar as estruturas de opressão machista e patriarcal da sociedade em que vivemos, por isso, na minha opinião, este vídeo reforça a ideia misógina de que as mulheres somos más mas espertas e nos aproveitamos da “discriminação positiva” para maltratar os homens.

Só mais um apontamento, está campanha foi feita no Reino Unido, onde os homens se queixam de que são os últimos da fila em direitos e importância social. Os que usam este argumento esquecem-se de dizer que todas as leis e medidas tomadas e das quais os homens no Reino Unido se queixam tanto, nascem para proteger as mulheres e crianças da opressão machista e patriarcal ou seja:

- Queixam-se de que as mulheres ficam com metade dos bens conjuntos do casal, no caso de divórcio, mas esquecem-se de que ganhamos em média 22% menos que os homens realizando o mesmo trabalho.

- Queixam-se que as mulheres normalmente ficam com as crianças mas esquecem-se que a sociedade na qual vivemos é uma sociedade machista que entende que nós, mulheres, vamos saber cuidar melhor deles. Sim, este é o principal motivo pelo qual os filhos ficam ao cuidado da mãe (quem melhor do que uma mãe para cuidar dos seus filhos!) só depois são considerados os outros factores, como as condições económicas, emocionais, etc.

- Queixam-se de ter que passar uma pensão para os filhos mas esquecem-se que somos nós as que temos menos recursos.

Queixam-se, queixam-se e queixam-se… e a maneira que encontram para dar voz as suas queixas é manipulando a realidade?

Senhores do MandKind – Initiative, a problemática da violência doméstica e da violência de género é demasiado grave, mais de 10.000 (dados oficiais em Fevereiro 2014) mulheres e crianças são expostas a este tipo de violência no Reino Unido, por isso não manipulem dados nem façam vídeos tendenciosos não é assim que vão erradicar as injustiças sociais, judiciais, culturais que fazem de nós (todos os seres humanos) vítimas de uma sociedade machista, patriarcal e capitalista.


Já agora, aproveito e partilho este TED de Jackson Katz onde fala sobre a violência de género de uma forma que raramente ouvimos os homens falar e que pode ser interessante para começar a olhar para esta problemática de uma outra forma. 


‪#‎ViolenceIsViolence

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