Temporada 2015/16

Pintura de Kazuhiro Hori

Do útero ao corpo

Quando em 2009 mergulhei de cabeça no autoconhecimento do meu ciclo menstrual comecei a ter mais consciência das marcas que o patriarcado deixou (e deixa) no meu corpo.

Não é difícil constatar que como mulher[i] fui (fomos) criada e educada dentro de um determinado modelo e a minha necessidade de afecto[ii] tem produzido mudanças no me corpo.

Explorando o ciclo menstrual, descendo a minha mente ao corpo, fui tomando consciência dessas marcas no meu corpo (no nosso corpo de mulheres): útero contraído, garganta bloqueada, tensão na zona dos ombros, no plexo solar, na zona lombar…

Estas marcas são as correntes que o patriarcado tem para nos controlar é o que antropologicamente se conhece por embodyment, ou seja, como a cultura entra fisicamente no meu corpo (no nosso corpo). Como o modela e modifica substancialmente.

Trabalhar o meu ciclo menstrual e (re)conhecer as 4 Capuchinhas/mulheres que habitam em mim deu-me perspectiva para ampliar a consciência que eu tinha deste embodyment.

Por exemplo, a nossa forma de caminhar, a forma como desfrutamos da nossa sexualidade, a nossa postura, a mobilidade da nossa pélvis, depressão, … tudo está profundamente influenciado pelo nosso entorno.

Não são precisos anos de pesquisa, para intuirmos que a nossa sexualidade não é igual a das mulheres brasileiras ou que o nosso corpo se move de forma diferente ao das mulheres africanas.

Cada uma de nós mostra através do seu corpo e da sua relação com ele, os desígnios e valores que a cultura onde cresceu lhe foi imprimindo na pele, na carne e no osso.

Para esta temporada de “Compreende o teu ciclo, vive a tua lua” proponho-vos um desafio: reconhecer juntas as marcas do patriarcado no nosso corpo e libertarmo-nos delas.


[i] Mulher foi o primeiro fato  que o patriarcado me vestiu, nada mais nascer. Fato que tive que despir  e vestir mil vezes para o ajustar e adaptar até me sentir confortável com ele. E provavelmente os arranjos ainda não são definitivos.                                                               
[ii] De reconhecimento, de validação, de espaço, de voz…

1 comentário:

  1. Grande editorial Aida! Obrigada por partilhares estes pensamentos e vontades! Já está na altura de falarmos abertamente sobre as influências de anos e anos sobre o nosso papel social e pessoal, e, acima de tudo, de mostrarmos que estamos despertas para elas. É o primeiro passo para desbravar o caminho que nos leva a sentirmo-nos bem e presentes na nossa própria pele, no nosso próprio corpo.

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