Mães, Filhas e Menarca (1ª menstruação)

Muitas mulheres escreveram-me a perguntar se o livro ”Por Trás da Capa Vermelha” é para meninas, para acompanhar a  Menarca (1ª menstruação)… a resposta é sim e não. Já sei, assim ficam a saber o mesmo!

Sei que parte da questão se formula devido ao aspecto da capa (os traços da ilustração e as suas cores) e outra porque cada vez mais mulheres estão a recuperar a tradição de acompanhar as outras mulheres nas etapas de transição. 

Para responder a questão vou partilhar uma reflexão convosco que se prende com o acompanhar as nossas meninas durante a Menarca e outro dia falamos da capa e do seu “ar infantil” (expressão usada por algumas mulheres nos email's que recebi), pode ser? ;)

Eu vou tentar explicar a minha visão sobre para quem esta dirigido o livro. Recordo-me que quando trabalhei em escolas de 2º/3º ciclo as meninas (prepúbers) e jovens (púbers) nessas idades são curiosas e que entre elas partilham muitas coisas sobre a menstruação e essas coisas de “mulheres” (tal e qual eu, nós na sua idade) e senti que quando a escola organizava palestras, tertúlias, encontros sobre sexualidade, as meninas ficavam a espera que xs orientadorxs falassem sobre essas “coisas” que elas partilham, normalmente na casa de banho (um dos motivos pelos quais vamos juntas a casa de banho na pré e na adolescência é para falar das “nossas coisas”).

Mas na verdade é que nesses encontros escolares sobre sexualidade não falam muito ou não como elas (e nós) esperavam sobre as “coisas de mulheres” e por isso muitas vezes preferem as suas tertúlias na casa de banho da escola (têm mais privacidade e podem falar sobre o que realmente lhes interessa).

Muitas vezes nesses encontros organizados pela escola, onde muitas vezes são convidadxs psicólogxs ou outros técnicos ligados a saúde e a educação sexual, passa-se a ideia (de forma directa ou indirecta) de que quando uma menina menstrua já é uma mulher e isso não é verdade. 

Quando uma menina menstrua, continua a ser uma menina e elas sentem-no assim por isso as vezes é muito complicado para elas gerir física, psicológica e emotivamente esta ideia que lhes é transmitida (mesmo que subtilmente) com aquilo que elas realmente sentem e têm percepção e por isso muitas vezes torcem o nariz e ficam “tristes” quando surge a 1ª menstruação (Menarca).

Várias mães já me comentaram que a sua filha ficou triste quando menstruou e que não gosta nem lida bem com novo acontecimento e que não sabem como acompanhar as suas ‘mulherzinhas’

Se pensarmos um pouco, quando tínhamos a idade delas e quando menstruamos pela primeira vez quase todas nós desejamos uma coisa: que ninguém de repente, porque tínhamos a cueca com umas pintas de sangue, nos começasse a tratar de forma diferente, queríamos que respeitassem o nosso espaço e tempo, deixando-nos sentir aos pouco a nossa própria identidade cíclica.

O nosso corpo-mente-emoção vai mudando com o aparecimento da 1ª menstruação mas cada uma de nós tem o seu próprio caminho até ser mulher, e como sabemos que chegamos a essa etapa?!?! A esse estado de "ser mulher"?!!?

Cada uma sabe quando isso acontece, qual é o seu momento.

Agora como mulheres adultas, sabemos que esse momento não esta cingido apenas a nossa capacidade de nos reproduzirmos (e quando somos meninas já intuímos isso, intuímos que ser mulher é muito mais do que menstruar e talvez por isso não gostamos que nos digam “já és uma mulherzinha” só porque menstruamos pela 1ª vez) e que uma mulher não se define como "o ser humano que pode procriar".

Para além disso, Menstruar não significa propriamente ovular, nos primeiros anos da menstruação a ovulação ainda não esta ajustada, ou seja, as vezes não ovulamos. O nosso corpo passa por um processo (cada corpo pelo seu) onde se vai adaptando as novas mudanças hormonais e neurológicas e durante este processo o que as meninas procuram são referentes:

*Por isso vão em grupo a casa de banho para falar de “coisas de meninas”.
*Por isso vão as palestras esperançadas de que quem as orienta sejam mulheres que conheçam as suas fases e desfrutem delas (mas nem sempre isto acontece).
*E por isso também “observam” a sua própria mãe ou referentes de mulheres adultas importantes na sua vida (tias, imãs mais velhas…).

Cada uma de nós como mulher adulta é um referente para qualquer menina e adolescente… e por isso temos que ter presente na nossa mente que todas nós tentamos construir a nossa identidade desde pequenas, questionamo-la, ampliamo-la e redefinimo-la durante a adolescência e provavelmente ao longo da nossa vida, por isso somos um referente em constante construção, e talvez por essa construção e reconstrução ser constante mesmo sendo mulheres adultas (seja lá o que isso signifique para cada uma de nós) por vezes quando nos dizem “És uma mulher” nos sentimos alheias a esse corpo de mulher adulta que somos. 

Agora só nos basta imaginar (e recordar) como se sente uma menina de 10 ou 11 (12,13…) anos, idade onde a construção-desconstrução-reconstrução do seu corpo-mente-emoção é uma montanha russa acelerada!

Por isso como referentes para (todas) as meninas (sejam ou não nossas filhas) temos duas tarefas nas mãos:

1.Não repetir o que muitas de nós ouvimos quando menstruamos pela primeira vez “Já és uma mulherzinha”. Menstruar não é sinónimo de mulher.
2. Se ainda não conhecemos as nossas fases e desfrutamos delas, começar a fazê-lo.

E chegado a este ponto da minha reflexão, já posso responder melhor a questão inicial, o livro é para todas as mulheres que têm estas tarefas entre mãos (e para muitas outras mulheres). Ele não foi propriamente escrito para as meninas entre os 10 e os 16 anos mas foi a pensar nelas também. 

Como mães ou mulheres que acompanham meninas e jovens (ou seja todas nós directa ou indirectamente) destas idades e podemos usar este livro como ferramenta mas primeiro deves ser usado para autodescoberta da mulher cíclica que somos, permitindo-nos gozar as nossas fases e ritmos e segundo como um livro para partilha com as nossas meninas.

O que eu quero dizer é que é contraditório oferecer, simplesmente um livro as nossas meninas que fala “das coisas de mulheres” se nos não somos um referente positivo, ou seja, se não somos mulheres que conhecemos e gozamos a nossa ciclicidade por isso primeiro ele é para nós e depois para ser partilhado com elas.

A nossa ciclicidade é um processo muito importante que gera mudanças e que nos conduz a um autoconhecimento e a um constante ampliar dos nossos próprios limites corporais-mentais-anímicos, por isso a melhor maneira de transmitirmos isso as nossas meninas é nós mesmas nos permitirmos vivenciar gozosamente esse processo (foi por isso que escrevi o livro para que possa acompanhar a cada uma de nós a viver prazerosamente o seu próprio processo) e deixar que elas, as meninas, (observando-nos) descubram o seu… que não será igual ao nosso porque cada uma de nós é única e tem as suas próprias nuances.

Por isso o livro é para todas as mulheres de todas as idades mas se o queres oferecer a uma menina que vai em breve receber a sua 1ª menstruação ou que esta na primeira etapa desta jornada cíclica, peço-te que não te esqueças que é importante que tu também caminhes com ela (a seu lado) sendo simplesmente um referente positivo e prazeroso e que explorar juntas o livro torna a jornada cíclica uma verdadeira aventura. 




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Tenho duas propostas para ti…
Por trás da Capa Vermelha – Um livro-agenda sobre o Ciclo Menstrual
Programa de Educação Menstrual – Consultas e Ateliers de Autoconhecimento



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