"Devo" ou "Não devo"



Já vos falei em outras entradas das 4 Capuchinhas que somos e de como elas são diferentes entre si, e de como elas se complementam e dão forma a mulher que somos. 4 em 1.  

Pois é, as 4 Capuchinhas têm privilégios diferentes na nossa sociedade/cultura. É inevitável. Socialmente há fases que estão mais aceites e inclusive promovidas do que outras, por isso nos sentimos mais confortáveis nas fases Pré-ovulatória e Ovulatória (a metade luminosa do ciclo) e desejamos ficar nelas sempre. Pois, geralmente, achamos que estar loquazes, energéticas, faladoras, sociais, bonitas e brilhantes é o nosso estado natural mas é mentira…. Quando tentamos reprimir as outras Capuchinhas (fases do ciclo) que também somos, só conseguimos frustração e mau humor.

Não é mau reconhecermos que nos é mais fácil estar nas fases “luminosas” mas a chave aqui é permitir-nos espaço e tempo para nos conhecermos, com mimo e curiosidade, nas fases menos familiares, menos luminosas. Talvez para algumas de vocês a Capuchinha da fase Pré-menstrual seja a que mais dificuldades coloque, principalmente para as que sois doces, atentas, mimosas e dispostas enquanto para outras a fase Ovulatória é a mais difícil, principalmente se somos mais solitárias, intelectuais e independentes. Cada uma de nós tem uma face solar (a que mais dominamos e que gostamos mais) e a face lunar (que gostamos menos e desconhecemos mais). Aqui o desafio é investigar este lado oculto para não sobrecarregar o lado que já conhecemos e aprender as outras potencialidades que temos e ignoramos, no livro “Por Trás da Capa Vermelha” falo mais detalhadamente das potencialidades das 4 Capuchinhas que Somos.

Tenho-me apercebido que este sentir-nos mais confortáveis na pele de umas Capuchinhas mais do que de outras também influencia a forma como cada Capuchinha se relaciona com a comida, ou seja como nós nos relacionamos com a comida em cada fase do Ciclo Menstrual. Passo a explicar a minha investigação/reflexão.

Quantas vezes já comeram algo pouco saudável (mas delicioso) porque disseram a vocês mesmas, “tu mereces” ou simplesmente para “mimar-te a ti mesma”? Pois é… temos o (péssimo[i]) hábito de usar a comida como prémio ou castigo.

Lembram-se quando foi a primeira vez que o fizeram? Ou, mais certeiramente, a primeira vez que “vos fizeram” isto? A primeira vez que a comida foi utilizada como prémio por terem feito algo bem ou como estimulo (leia-se suborno) para que cedêssemos a portar-nos bem numa determinada situação?

Não vou questionar este método de manipulação do comportamento e este post não se trata de culpar a algo ou a alguém pela nossa maneira de ser, mas sim, de investigar por que motivo fazemos as coisas.

Continuo com o meu questionamento.

O que é que acontece quando ocorre o contrário? Alguma vez não vos deixaram comer certos alimentos? Alguma vez vos disseram que não podiam comer algo que vocês gostavam como castigo? Talvez já vos obrigaram alguma vez a ficar sentadas na mesa e a acabar a vossa comida porque se portaram mal ou porque “há meninxs que passam fome no mundo”?

Estou certa que já se lembraram de várias situações, principalmente entre os 4 e os 6/8 anos… mas vamos avançar no tempo até a nossa idade actual.

E agora? Utilizam alguma vez a comida como forma de castigo ou prémio na vossa vida? Por vezes não vos permitis certos alimentos quando “se portam mal” como a vossa dieta[ii]? “Obrigam-se a vocês mesmas” a comer certos alimentos porque pensam que são os alimentos que precisam?

Estes comportamentos têm raízes muito profundas e não é necessário sermos psiquiatras para perceber que as implicações de vincular a comida com o comportamento têm um impacto duradouro na nossa vida e no que sentimos por nós próprias.

Tenho-me apercebido que uso este mecanismo de prémio ou castigo com as 4 Capuchinhas, ou seja, comigo. E sei que o que expus nas primeiras linhas, de me sentir, de nos sentirmos mais confortável com umas Capuchinhas do que com outras é parte da base de esse comportamento. Comecei a observar-me, a investigar-me e apercebi-me que sou uma mulher com duas faces, uma luminosa e outra escura e que no decorrer do Ciclo Menstrual estas duas se desdobram em quatro.

Nas fases luminosas do Ciclo Menstrual (Capuchinha Indomável e Capuchinha Sedutora)[iii] temos tendência a sentir-nos mas felizes, o mundo parece diferente, em sentido positivo. Vemos as mesmas situações como oportunidades e as mesmas pessoas (e possivelmente até nós mesmas) como raparigas boas. É Assim que nos é apresentado o mundo na fase luminosa do Ciclo, vemos o mundo através das “lentes da felicidade”. O mundo que nos rodeia não mudou tanto e, mesmo assim, a nossa experiência em relação com esse mundo é radicalmente diferente.

Nas fases escuras do Ciclo menstrual (Capuchinha Feiticeira e Capuchinha Vermelha)[iv] temos tendência a sentirmos furiosas, o mundo pode parecer-nos um lugar tremendamente ameaçados e certos alimentos podem parecer-nos uma alternativa bastante reconfortante ou uma feliz distracção. Neste particular estado do corpomente tendemos a ver certas situações como obstáculos e outras pessoas (e inclusive a nós mesmas) como raparigas más. É assim como nos é apresentado o mundo quando o olhamos através das “lentas da raiva”.

Estas duas formas de ver o mundo, de dividi-lo, estes hábitos de pensamento sobre mundo e do espaço que as 4 fases do Ciclo Menstrual devem ocupar nele (umas muitos, umas pouco e outras nada) estão intimamente relacionadas com os valores e com as apetências que a nossa cultura valoriza ou desvaloriza nos seres humanos e concretamente nas mulheres. No nosso caso, como mulheres cíclicas que somos, este muito, pouco ou nada, levando-nos a aceitar melhor as fases luminosas (activas) que as fases escuras (contemplativas) do nosso Ciclo menstrual.

Por exemplo, eu tenho a tendência a ser mais permissiva com a Capuchinha Feiticeira deixando-a fazer “mais asneiras” alimentares do que as outras Capuchinhas, talvez a minha permissividade seja para ela não ter “ataques de raiva”.
Quando evito (mesmo sem me aperceber) que ela se expresse através da sua linguagem própria (essa que me permiti ter a percepção afiada, ser capaz de perceber com pulcritude, com tanto atino e paixão), quando não lhe permito sentir determinadas emoções (as tais que geram comportamentos que a nossa cultura tenta esconder) estou simplesmente a evitar que ela faça (que eu faça) a sua síntese emocional e que use os Super Poderes de Mulher. Quando não usamos os nossos poderes estes se transformem em Síndrome PMenstrual, por exemplo.

É verdade que muitas de nós usamos o chocolate, os pastéis e os hidratos de carbono como calmantes na fase pré-menstrual e podemos justificar isso devido ao aumento do gasto energético basal que ocorre nos dias prévios a menstruação porque sobe a temperatura basal pela progesterona e há mais apetite. Mas a verdade é que habitualmente fazemos coisas sem ser conscientes dos pensamentos que nos conduzem a esse comportamento.

Pode ser que comam um chocolate especialmente na fase pré-menstrual e menstrual para vos ajudar a calmar a ansiedade. E se for chocolate preto que possui antioxidantes e aumenta os níveis de serotonina o que nos ajudam a melhorar o ânimo ainda melhor. Não tem mal nenhum em querer sentir-nos bem (pelo contrario o prazer e o bem-estar são um bem maior) o problema é quando não estamos simplesmente a satisfazer uma necessidade do nosso corpomente (que podíamos faze-lo com outros alimentos como bananas, batatas, gérmen de trigo, agriões, nozes, couves de bruxelas… e não apenas com chocolate, todos tem em comum a B6 que é a que acalma o sistema nervoso) queremos evitar sentir certas emoções e sensações como a raiva, a vulnerabilidade, a sensação de preguiça, queremos evitar estar no nosso lado escuro e ver o mundo a cru, como ele realmente é. E é aqui onde as “asneiras” alimentares durante a fase pré-menstrual são uma armadilha. Eu devia comer e gostar de comer chocolate porque me faz sentir bem e não para evitar ser quem sou porque a cultura não gosta da minha Capuchinha Feiticeira.

Por isso escrever sobre o bem-estar menstrual através da nutrição inclui falar não só dos alimentos adequados para viver um ciclo saudável e sem moléstias maiores, mas também de como ser conscientes da influência dos próprios pensamentos e crenças é importante já que a forma como comemos, pensamos e agimos durante todo o ciclo influência como vivemos os dias prévios a menstruação e a menstruação.

Quando me apercebi do meu comportamento com a comida e de como ele era diferente em cada fase do Ciclo Menstrual apercebi-me também de como a tentação está em tentar romper os hábitos, resistir ao impulso de actuar dessa maneira ou convencermo-nos a nós mesmas de que devíamos comportar-nos assim ou assado (mas nunca como realmente somos em cada fase hormonal).

“Romper, Resistir, Convencer”. Ufff! Não tem bom ar este lema! Não parece uma boa receita para a paz mental, pois não?
4 mulheres a habitar o nosso corpomente, cada uma delas com os seus próprios “devo” ou “não devo” comer isto ou aquilo. Cada uma com os seus próprios desejos… Que confusão!!!!  Não se trata disso… conhecer as 4 Capuchinhas não passa por ai.  

Pensem nisto: o corpomente que diz “devo” é o mesmo que diz “não devo”. Só há um corpomente[v], não há dois. Por isso como pode esta situação terminar de forma pacífica?

Para além da simples loucura que é discutir com nós mesmas com esta atitude umas Capuchinhas tinham de ganhar e outras que perder. Isto significa que uma parte de nós deve ser rejeitada, ignorada ou suprimida enquanto a outra parte (capuchinhas) nos faz sentir bem e gostamos de a mostrar. Mas o que realmente acontece desta maneira é que nenhuma ganha e só conseguimos gestar uma intensa discussão interna sobre o que esta bem e o que esta mal.

Comer de forma consciente e entender que nos relacionamos com a comida de forma cíclica é uma técnica/ferramenta única.

Não se trata de falar com nós mesmas nem de ter um pensamento positivo nem de silenciar a vozinha interna que não nos larga. Ensina-nos a distanciar-nos do “devo” e do “não devo” na mesma medida, permitindo-nos ver com claridade a dinâmica que ocorre no nosso corpomente. E contemplar o nosso corpomente dessa maneira permite-nos ser testemunhas das sensações que experimentamos (em cada fase do Ciclo Menstrual) em vez de sermos reféns delas.

É como se tivéssemos a capacidade de responder desde uma posição de hábil intenção em vez de reagir desde a posição de confusão ou frustração. Volto a relembrar:

A verdade é que habitualmente fazemos coisas
sem ser conscientes dos pensamentos
que nos conduzem a esse comportamento.

Depois de perceber quais os comportamentos que estamos a punir ou a privilegiar (de cada uma das 4 Capuchinhas) podemos passar a etapa seguinte: investigar sobre as nossas necessidades nutricionais nas diferentes etapas do Ciclo Menstrual. Mas isto fica para outro post ou para o Atelier Mulheres, Comida e Cuidados.

Não te vás embora sem deixar o teu comentário e nos contar como se relacionam as tuas 4 Capuchinhas com a comida. 





[i] Ou não… que sei eu!
[ii] Quando menciono a palavra dieta não me refiro a dietas de emagrecimento e sim a nossa dieta alimentar. A forma como nos nutrimos.  
[iii] Fase pré-ovulatória e ovulatória
[iv] Fase pré-menstrual e menstrual
[v] É verdade, que habitam 4 mulheres em nós e que são diferentes entre si mas por muito diferente que sejam todas têm o mesmo objectivo. Sim, é verdade! Todas querem gozar e sentir-se bem consigo mesma. O nosso corpomente vai mudando para isso mesmo, para encontrar a forma de viver de forma favorável as 4 juntas. 

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